sábado, 2 de julho de 2011

Um papo sobre alfabetização

Pedro sempre reclamou dos exercícios de alfabetização que vinham da escola. 

A rotina do copia palavras, separa palavras, decora palavras, sempre foi acompanhada de reclamações.


Não que que não fizesse os exercícios, mas fazia-os sob protestos. Não que não os fizesse certos, é que achava-os aborrecidos.

Isso sempre me inquietou porque ele gosta muito de livros, tem um vocabulário vasto desde muito cedo, adora rimas, trava-línguas, enfim, a Língua Portuguesa nunca me pareceu que fosse uma coisa que o assustasse, pelo contrário.

Agora que Pedro está nessas "férias antecipadas porque não gosta da professora e vai mudar de escola", como ele tem anunciado feliz da vida para cada um que encontra na rua (e isso quer dizer: Pedro tem anunciado literalmente, para todos! Numa descida de elevador, por exemplo, ele resumiu todo este blog para os vizinhos!), resolvi não interromper sua alfabetização e mergulhei em algumas leituras para tentar dar conta do recado.

Já tinha uma premissa: ser lúdica e fugir da rotina. 

Tendo isso em mente recorri ao mais fácil: "A revista de quem educa" (A Nova Escola, é ótima e vendida a preço de custo). 

Lendo a revista relembrei que no processo de alfabetização a criança segue estágios que variam de acordo com aquilo que ela acha que é o adequado para se comunicar graficamente, ou seja, varia de acordo com as suas hipóteses de escrita, que são:

1- Hipótese pré-silábica: divide-se em dois estágios:

1.1- Estágio 1
Nesse primeiro estágio a criança tenta diferenciar o desenho da escrita, atribuindo letras aleatoriamente às palavras

1.2-Estágio 2
Aqui acontecem duas coisas: as crianças percebem que é preciso uma quantidade mínima de letras para que escreva algo (mínimo de três) e que é precisso que haja uma ordem interna entre as letras para que consigam ler o que escreveu. Nessa etapa a criança usa as letras aleatoreamente e sem uma quantidade definida.


2- Hipótese silábica: também divide-se em dois estágios:

2.1- Silábico sem valor sonoro
Ocorre quando a criança representa cada sílaba por uma letra qualquer, sem que corresponda ao som que ouve, por uma vogal ou consoante que represente o som enunciado.

2.2- Silábico com valor sonoro
Aqui cada sílaba é representada por uma vogal ou consoante que expressa o seu som correspondente.

3- Hipótese silábico alfabética
É um período de transição em que a criança trabalha tanto com a hipótese silábica como com a alfabética.

4- Hipótese alfabética: é a fase em que cada fonema é representado por uma letra. Nesse momento a criança ainda apresenta os erros ortográficos mas já entende a lógica da escrita.

Com a memória fresca e sabendo que modernamente não se começa mais pelo beabá, nem pelas sílabas, mas sim pelas palavras, parti para o diagnóstico, ou seja, ditei quatro palavras para Pedro, partindo das polissílabas e chegando às monossílabas, mais uma frase.

Como sabia que deveriam ser palavras diferentes das que conhece de cor, ditei o que me veio à mente. 

Não sei se escolhi palavras erradas, se ele não me levou à sério, ou se realmente era esse o seu estágio mas, por aquele ditado, feito no dia 22/06, Pedro era pré-silábico. Para a palavra PÉ, por exemplo, usou as letras "IBM".

A indicação dos manuais é de que esse ditado seja feito regularmente a cada dois meses mas, confesso, resolvi fazê-lo a cada dois dias para saber que Pedro estará partindo para a nova escola.

Assim, dia 24/06 parti para mais um ditado e nesse dia Pedro já fez uma escrita silábica sem valor sonoro. Para a palavra CABELUDO  escreveu "R/P/A/P".

O terceiro ditado aconteceu no dia 27/06 e nele Pedro escreveu de forma silábica com valor sonoro. A palavra URUBU, grafou da seguinte forma: "U/R/B".

E, finalmente, no mais recente ditado, feito no dia 29/06 Pedro escreveu como um silábico-alfabético. Foi assim que grafou LIBÉLULA: "LI/B/LU/A". 

Resumo da ópera: será que em sete dias Pedro, brincando com as letras em casa, saiu do estágio pré-silábico para o silábico-alfabético? 

Ou será que ele já estava nessa fase e a escola nem notou que o seu aborrecimento poderia ser por isso (também)? 

Será que na escola não houve espaço para que ele desse pistas do que sabe? Em casa as pistas têm aparecido. Um exemplo: ontem pedi que conferisse se todos os itens que estavam na lista do mercado foram comprados e ele conferiu palavra por palavra. 

O que percebi é que quando Pedro se viu livre do enclausulamento imposto pelas palavras a serem estudadas na escola, quando começou a se arriscar na escrita e na leitura das palavras que têm significado para ele, libertou-se da certeza do "não sei ler e escrever" e, simplesmente, começou a fazê-los. 

Para saber mais:
Revista Nova Escola



Sala de Recursos no Paraná

Contação de História na Biblioteca Popular da Tijuca

Não está no cartaz mas será nos dias 7 e 14, quintasfeiras, às 14h, com Elci Narasaki e grupo de contadores de histórias.

Ciranda de Histórias nas Bibliotecas do Rio